Salvador Sobral, vencedor do Festival Eurovisão da Canção, foi submetido a um transplante de coração esta sexta-feira, 8 de dezembro.  Os pormenores da operação, no Hospital de Santa Cruz, em Carnaxide, Oeiras, foram dados este sábado, 9 de dezembro, pela equipa que o operou, que disse que a recuperação será demorada, o que é normal neste tipo de transplantes, mas que o músico “vai ter uma vida completamente normal” se tudo correr bem.

"Os desafios são os de qualquer transplante. A cirurgia correu bem, correu bem sob todos os aspetos. Não creio que este fosse um desafio diferente dos outros. Atrás deste dia estão muitos meses de dedicação de muitos profissionais (...) A cirurgia correu bem", disse o cirurgião Miguel Abecassis, o médico responsável pela equipa que operou o cantor.

"A recuperação, o que posso dizer, é que tudo está a evoluir bem. O Salvador está muito animado, muito bem disposto", frisou, revelando que o cantor pediu para ouvir música clássica antes da operação. "[Quando lhe dei a notícia], Ele só me disse três coisas: perguntou-me se eu estava em forma, eu disse que sim, perguntou se podíamos pôr música e que ele preferia música clássica, e finalmente desejou-me sorte", contou, sublinhando ainda que o vencedor da Eurovisão "estava muito bem preparado, é um jovem muito inteligente e que recebeu muito bem a notícia do transplante".

"É gesto de generosidade e de amor muito grande"

Sobre a recuperação, o médico explicou que não é possível avançar com uma previsão de quanto tempo o músico vai ficar internado, mas que espera que o músico volte o mais breve possível à sua vida. "Se tudo correr bem, ele cairá no grupo dos doentes que, em cinco anos, [terá o coração a funcionar] à volta dos 85% e terá uma vida completamente normal. É isso que a gente quer", explicaram os médicos.

Questionados sobre as primeiras palavras de Salvador Sobral, os médicos revelaram que o cantor agradeceu a toda a equipa. "E disse-o com boa voz", assinalou a equipa.

O médico José Neves explicou ainda que "o transplante é a ponta do iceberg de qualquer doente transplantado" e que, no caso de Salvador Sobral, é o resultado de "muitos meses em lista de espera e muitos meses internado".

"Este é um exemplo típico de um gesto de generosidade e de amor muito grande. Nos tempos que nós vivemos, isto deve-nos fazer reflectir mais do que fazer perguntas", disse ainda em conferência de imprensa o Dr. Miguel Abecassis

Os médicos frisaram ainda que a identidade do dador não será revelada.

Também na página de Facebook do cantor, foi partilhado um post a "agradecer a preocupação e o carinho".

Salvador Sobral, de 27 anos, sofre de insuficiência cardíaca em estado avançado e estava desde setembro a aguardar por um dador compatível.

Depois de vencer o Festival Eurovisão da Canção, em maio, em Kiev, Salvador Sobral correu o país de norte a sul, tendo dado mais de 30 concertos. Por motivos de saúde, o cantor foi obrigado a afastar-se temporariamente dos palcos.

"Já não é segredo para ninguém que a minha saúde é frágil. Tenho um problema e chegou infelizmente a altura de me entregar - entregar, digamos, o meu corpo - à ciência e, consequentemente, ausentar-me da vida de concertos e de música no geral. Sair um bocado deste mundo dos civis e ir para um outro onde, certamente, este problema será resolvido. Infelizmente não sei quanto tempo vai demorar", explicou o músico num vídeo onde anunciou o seu afastamento dos palcos.

Salvador Sobral deu a Portugal a primeira vitória no Festival Eurovisão da Canção. Em Kiev, o músico português interpretou "Amar pelos Dois", tema composto pela sua irmã Luísa Sobral, e conquistou a pontuação máxima dos jurados e do público internacional - Portugal foi o país mais votado por parte dos jurados de cada país em concurso, com 382 pontos.

Ao receber o prémio, o músico português fez declarações que correram o mundo. "Vivemos num mundo de música descartável, música fast food, sem qualquer conteúdo e isto pode ser uma vitória para a música, das pessoas que fazem música que significa qualquer coisa. Música não é fogo de artificio, música é sentimento. Vamos tentar mudar isso. Vamos trazer a música de volta ao que realmente importa", disse Salvador Sobral.

"É uma boa vitória para a música. É um bom passo as pessoas terem gostado desta música", frisou em entrevista à RTP1. "O Caetano Veloso fez um vídeo a dizer que queria que eu ganhasse a Eurovisão... vale mais que esta coisa (o troféu)", disse ainda jovem de 27 anos.

O gosto pelo jazz e um modo inquieto de estar na música

Salvador Sobral nasceu em Lisboa, em 1989, ouvia música desde criança e, numa entrevista ao El País, recordou as viagens em família, as canções partilhadas com os pais, dos Beatles, dos Genesis, de Simon & Garfunkel e John Lennon, sobretudo clássicos dos anos de 1960/70, e as harmonias feitas com a irmã.

Salvador Sobral

O primeiro concurso de talentos surgiu na sua vida aos dez anos, um Bravo, Bravíssimo, na SIC, onde voltaria aos 18 anos, para o Ídolos. A experiência ficou para trás, dedicou-se a um curso de Psicologia e a um Erasmus em Maiorca. Para ganhar dinheiro, começou a cantar em bares. E foi aí que tudo mudou.

Descobriu Chet Baker, através de um guitarrista argentino com quem cantava: "Deslumbrou-me. Parecia uma angústia misturada com esperança, com melancolia, tudo numa só pessoa. Identifiquei-me totalmente com ele e com o seu estilo", disse na entrevista ao jornal espanhol El País, publicada no passado dia 16 abril.

O curso de Psicologia deu lugar ao de Música, e Maiorca a Barcelona, onde, em 2014, começou a atuar com a banda Noko Woi, com quem atuou no festival Sonar. Um ano mais tarde seria uma voz na programação dos festivais Mexefest e, no seguinte, entraria no Cool Jazz.

Na altura tinha já publicado "Excuse me", o álbum de estreia que chegou às lojas em março de 2016, com uma sonoridade marcada pelo jazz e pela pop.

O disco resume os gostos do cantor, as suas referências, entre as composições escritas por si mesmo, com Leo Aldrey, às quais juntou versões de "Autumn in New York", de Vernon Duke, um 'standard' do jazz, ou "Nem eu", de Dorival Caymmi.

O disco inclui igualmente "I might just stay away", canção escrita por Luísa Sobral, inspirada na obra do trompetista Chet Baker, uma das principais referências do cantor.

Em "Excuse me", Salvador Sobral surge em quarteto, acompanhado por Júlio Resende (piano), que coproduziu o disco, André Rosinha (contrabaixo) e Bruno Pedroso (bateria).

A vitória no Festival RTP da Canção, em março de 2017, com "Amar pelos dois", aconteceu contra todas as expectativas: entre uma eliminatória e a final foi sujeito a uma intervenção cirúrgica. A fragilidade estendeu-se à atuação em Kiev, com a irmã a substituí-lo nos primeiros ensaios, por motivos de saúde, como destacaram as agências internacionais de notícias, presentes na Eurovisão.

O último concerto de Salvador Sobral antes do internamento 

Salvador Sobral deu a 8 de setembro o seu último concerto.  Durante o espetáculo, o cantor não escondeu as lágrimas e admitiu que estava a cantar com "um nó na garganta". "Não é fácil cantar com um nó na garganta constante", disse Salvador.

"Foi muito bom tudo o que aconteceu embora eu não tenha lidado bem com as coisas. Mas agora já estou em paz. Já digo aquelas coisas do 'mas você sabe com quem está a falar?'. Já abracei a vida de famoso”, disse o jovem músico.

Antes do concerto, foram distribuídos balões em forma de coração ao público. Estou sensibilizado com esta coisa dos corações(...) Vou receber todo o vosso amor e guardá-lo numa caixinha figurativa. Espero que caiba", disse o cantor, acrescentando, em tom de brincadeira, que "algum deles haverá de servir".

O cantor foi ainda surpreendido pela irmã, Luísa Sobral, que subiu a palco para um dueto em "Amar Pelos Dois". A meio da canção, Salvador Sobral abraçou a irmã e chorou nos seus ombros. "Chegou a hora do fim porque senão, de repente, já se torna um bocado vergonha alheia, um bocado deprimente. Obrigado por terem vindo a este concerto do até já", disse o músico.

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