Com uma ovação entre três e cinco minutos, conforme os relatos das revistas Variety e The Hollywood Reporter (THR), o 50.º filme de Woody Allen teve uma reação entusiástica do público em Veneza e uma parte substancial da crítica, enquanto na rua um grupo estimado em 20 pessoas fazia ouvir a revolta pelo festival "dar palco a realizadores violadores" (uma referência a uma programação que inclui os novos filmes de Roman Polanski e Luc Besson).

Mas isso não ofuscou a sua passagem pela passadeira vermelha, numa rara presença em público com a sua companheira Soon-Yi Previn e as filhas Manzie Tio Allen e Bechet Allen.

Rodado na França com Lou de Laâge, Niels Schneider e Melvil Poupaud nos papéis principais, "Golpe de Sorte" é um drama a partir do casual reencontro de dois ex-colegas de turma no liceu que envolve amor, casamento, adultério e crime. A estreia em Portugal está anunciada para 5 de outubro.

Numa crítica onde metade do espaço é dedicado ao escândalo à volta da denúncia de abuso sexual da sua filha adotiva que lhe assombra a carreira desde 1992, a THR diz que o filme, exibido fora da competição no Lido, é "competente, mas esquecível", enquanto o Deadline diz que é "surpreendente e tem ótimo aspeto, mas não consegue superar a escrita preguiçosa".

No extremo oposto, a Variety diz que é o melhor filme de Woody Allen desde "Blue Jasmine" (que tem 10 anos) ou mesmo "Match Point" (que é de 2005), opinião que é partilhada pelo crítico do The Guardian que atribui três estrelas, enquanto o The Wrap, mais comedido, diz que é um regresso à boa forma do cineasta de 87 anos.

Woody Allen, a companheira Soon-Yi Previn e as filhas Manzie Tio Allen e Bechet Allen

Apesar de ostracizado por grande parte de Hollywood por causa da alegação de abuso sexual, que sempre disse ter sido fabricada pela sua antiga parceira Mia Farrow, o cineasta disse que teve sempre "muita sorte" quando lhe foi pedido na conferência de imprensa antes da antestreia para refletir sobre o papel que esta teve na sua própria vida, já que isso volta a ser um tema no novo filme.

"Tive dois pais adoráveis, tenho bons amigos. Tenho uma esposa e um casamento maravilhosos, dois filhos. Dentro de alguns meses, vou fazer 88 anos. Nunca estive num hospital. Nunca me aconteceu nada terrível. Tive muita, muita sorte durante toda a minha vida", disse aos jornalistas.

E acrescentou: "Quando comecei a fazer filmes, todas as pessoas optaram por enfatizar o que eu era capaz de fazer bem e não me responsabilizar pelas coisas que fiz mal. Foram muito generosos comigo. E tive muita sorte com meu cinema. E recebi, ao longo da minha vida, muitos elogios que não merecia e uma enorme atenção e respeito. E portanto, não tive nada a não ser sorte. E espero que aguente. Claro que estamos no início da tarde, portanto veremos...".

Apesar de ter o mercado norte-americano barrado, Woody Allen foi questionado se voltaria a trabalhar na sua cidade natal.

"Tenho uma ideia muito boa para Nova Iorque e se algum tipo sair das sombras e disser ' Vou financiar o teu filme em Nova Iorque' e cumprir todas as minhas terríveis restrições – não pode ler o argumento, não pode saber quem está nele, apenas me dá o dinheiro e vai embora – se alguma pessoa louca concordar com isto, farei um filme em Nova Iorque", brincou.

"Coup de Chance"

Ainda que seja o seu primeiro filme inteiramente numa língua estrangeira, o realizador disse aos jornalistas que foi “muito simples” trabalhar em francês.

“Pude perceber pela linguagem corporal e pela emoção dos atores, sem entender a linguagem, quando eles estavam a ser realistas e quando não estavam", contou.

O filme foi originalmente concebido para ser sobre americanos em Paris, mas mudou de ideia.

"Pensei comigo mesmo: é o meu 50.º filme e adoro tanto Paris que o farei em francês... e então poderia pensar que sou um verdadeiro cineasta europeu", revelou.

Em vários entrevistas, Woody Allen disse que "Coup de chance" pode ser o último filme da carreira antes de se concentrar na escrita.

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