Slimmy – Não, nunca tive formação. Comecei, sim, a ouvir bandas muito cedo, de certa forma influenciado pelos meus irmãos mais velhos. Entretanto, fui apanhado na onda do Grunge, que me fez comprar a primeira guitarra. Com o passar do tempo, fui levando a música cada vez mais a sério, até que, com 18/19 anos, me apercebi que era esse o caminho que queria seguir.

PP – O domínio instrumental foi, então, algo que alcançaste sozinho…

S – Sim, sou auto-didacta.

PP – Foste, como dizes, “apanhado na onda do Grunge”, mas foi como DJ de Break Beat que deste, oficialmente, os primeiros passos no mundo da música…

S – Sim, fiz uns DJ sets de Break Beat pela Ribeira do Porto, mas foi algo muito passageiro. Só mais tarde me fixei, realmente, como músico.

PP – Como se dá a passagem entre o Break Beat e o Electro Rock - estilo que adoptaste no teu primeiro álbum de originais?

S – Sempre tive um espectro musical bastante grande. A partir do momento em que comecei a dedicar-me, efectivamente, à música, descobri vários estilos, várias tendências… Quando iniciei o meu projecto, era minha intenção fazer algo diferente, algo que fugisse ao que já estava a ser feito na altura. Daí a escolha do Electro Rock.

PP – Nos primeiros anos enquanto Slimmy, optaste pelo formato One Man Show. O que motivou essa escolha?

S – Simplesmente não encontrei membros fixos para formar banda, o que levou a lançar-me sozinho e a tocar todos os instrumentos em palco. Assim permaneci desde 1999 até 2003 – ano em que, finalmente, formei banda.

PP – Substituiste, a dada altura da tua carreira, o Porto – cidade onde nasceste – por Londres. O que te levou para Inglaterra?

S – Pouco tempo antes de me mudar para Londres, fiz uma maqueta com alguns temas meus. Como, na altura, não tinha manager nem editor, assumi eu mesmo o papel de paperboy e ofereci-a a todas as pessoas conhecidas que ia encontrando, entre as quais, Álvaro Costa, conhecido radialista e apresentador, que encontrei, por acaso, numa das Noites Ritual. Ele gostou do meu estilo, gostou daquilo que ouviu e, passado quatro dias, apresentou-me ao Saul Davies, guitarrista dos James, que, naquela época, morava em Portugal. Entretanto, o Saul Davies apresentou-me ao Quico Serrano, hoje meu produtor e técnico de som, com o qual entrei imediatamente em estúdio para gravar mais uns temas. Após a gravação, surgiu uma proposta, por parte duns ingleses, para tentar uma carreira em Londres. Como não tinha nada que me prendesse por cá, e já tinha alguma fluência no inglês, decidi arriscar.

PP – Sentiste, de certa forma, que as hipóteses de carreira, de êxito, eram maiores lá fora?

S – Sinceramente, não levei isso em conta. Pensei apenas que, a nível pessoal, seria uma experiência muito rica,seria uma aprendizagem enorme, não propriamente como músico, mas como pessoa.

PP – Foi, então, mais um desafio pessoal, do que um desafio profissional…

S – Exactamente. Apesar daquela cidade respirar música… Entretanto, lá, tive a oportunidade de dar imensos concertos e de evoluir muito enquanto músico. O facto de cantares em inglês para ingleses obriga-te a ser muito exigente contigo próprio, muito rigoroso, mesmo pró.

PP – Por que voltaste para Portugal?

S – Chegou a um ponto em que senti já estar preparado para enfrentar as «feras» aqui. Mas deixei lá uma porta aberta…

PP – “Enfrentar as feras”… Sentes, de alguma forma, que o público português é mais exigente do que o inglês?

S – Não se trata disso. Simplesmente, na altura, o pessoal em Portugal não consumia, habitualmente, aquele tipo de som, ao contrário do que acontecia em Londres, onde o pessoal curtia a minha música.

PP – Isso deu-te uma confiança acrescida?

S – Sim, voltei confiante, com vontade de mostrar um som fresco aos portugueses, uma mistura alucinante de ritmo, um pouco diferente daquele rock quadrado a que estávamos habituados.

PP – Os portugueses têm tendência a ser mais receptivos,a valorizarem mais o que vem do exterior. Sentes que o sucesso conquistado em Londres foi fundamental para o teu reconhecimento em Portugal?

S – Sim, mas não foi o único ingrediente. Voltei com uma forte força de vontade, perseverança. Aliás, não sou pessoa de desistir, pessimista. Gosto de andar para a frente, lutar pelas coisas. Não cheguei a Portugal a pensar que estava tudo ganho, cheguei numa de conquistar, de me esforçar para atingir os meus objectivos. A notoriedade externa não chega. Tens que ter um bom trabalho.

PP – Quais são, na tua opinião, as principais diferenças entre o mercado musical português e inglês?

S – Antes de mais, o mercado musical inglês mexe com quase 10% do PIB. Existe toda uma indústria, há dinheiro a circular entre bandas e editoras. Em Portugal, obviamente, isso não acontece. Estamos noutro patamar, embora tenhamos vindo a melhorar. Em Inglaterra a música é levada a sério, como uma profissão, uma forma de vida. Em Portugal, quando te assumes como músico, colam-te, ainda, um rótulo de inútil. Contudo, no que toca a música propriamente dita, acho que não devemos nada aos ingleses. Aqui há grande diversidade, há criatividade, originalidade, há grandes músicos.

PP – O teu álbum de estreia, “Beatsound Loverboy”, foi o culminar de muitos anos a compor música, uma espécie de best of. Como optimista que és, sempre acreditaste no seu sucesso?

S – Eu jogo sempre para ganhar, nunca jogo para perder ou para empatar. Cada música do meu primeiro disco foi escolhida como se de um single se tratasse, com a excepção da última faixa, que é um pouco diferente. Obviamente, estava à espera de alguma coisa. Mas sempre encarei o lançamento com calma. Passo a passo, chego lá – pensava. Não ficava demasiado contente quando era bem sucedido, nem demasiado triste quando não o era. Ia dando graças àquilo que ia conseguindo, sem criar grandes expectativas. Cada pessoa que se juntasse ao meu exército de mente aberta, de mente cool, era uma conquista. Sempre foi esse o meu espírito.

PP – Agora, já com dois álbuns na bagagem, e com toda a experiência entretanto adquirida, mudavas, se pudesses, alguma coisa no teu primeiro disco?

S – Mudava a capa, que é horrível. Tirando isso, não alterava nada. Eu tinha que começar de alguma maneira e considero o “Beatsound Loverboy” um bom começo.

PP – O facto de te teres feito acompanhar por quatro produtores não atrapalhou, de certa forma, a coesão do disco?

S - Não, até porque o disco saiu, quase que única e exclusivamente, da minha mente. Houve interferências dos produtores, mas muito poucas. Trazia as ideias de casa, não as discutia com mais ninguém. Mesmo o processo de gravação, fi-lo quase sozinho. Quase nem tinha banda, quando gravei alguns daqueles temas. E os produtores acabaram por se tornar uma espécie de meus melhores amigos. Os quatro acabaram por me entender bem, por entrar no meu mundo. Foi fácil. Tive sorte.

PP – Contudo, neste novo álbum, optaste por trabalhar apenas com dois produtores…

S - …que são repetentes do primeiro. Não fiquei com o Saul Davies porque, aquando da produção do álbum, ele estava em digressão com os James – o que tornou impossível a colaboração. Eis a razão de ter ficado apenas com o Quico Serrano e com o Mark Turner.

PP – Alguma da notoriedade por ti conquistada em Portugal deve-se à tua imagem irreverente. Qual a importância da imagem na tua carreira?

S – Na minha opinião, a vida é para ser vivida de uma forma diferente. Ser sério em demasia chateia, aborrece. Eu já era irreverente como cidadão. Nunca me quis parecer com ninguém. Sempre optei por andar exactamente como me apetecia, sem seguir padrões sociais, sem me preocupar com o que os outros dizem. Mas, respondendo à questão, a imagem é importante. Uma Lady Gaga, uma Madonna vivem muito da imagem, por exemplo. E, digam o que disserem, não há melhor profissão para se ser irreverente, para explorar a diferença. Mas só a imagem não chega. A ela têm que estar aliadas boas canções. Sem estas, cais no ridículo.

PP – A qualidade da música continua, na tua opinião, a ser o factor decisivo, portanto…

S – Quero acreditar que as pessoas privilegiam as minhas canções e composições face à minha figura, ao meu penteado, à minha irreverência.

PP – Chateia-te quando isso não acontece?

S – Isso acontece com quem gosta, realmente, de música. Só com esses me preocupo. Não me importo com o que dizem de mim, do meu aspecto – a partir do momento em que me exponho, tenho que estar preparado para todo o tipo de feedbacks. Há muita gente que me insulta. É público que tive relações com mulheres, mas continuo a levar com aquela homofobia, por causa do meu aspecto. Às vezes, chamam-me o Marilyn Manson português, porque ninguém sabe muito bem o que é o Marilyn Manson, sé é carne, se é peixe…mas eu divirto-me à brava com isso. Sinto que, mais tarde ou mais cedo, vai haver uma revolução na mentalidade das pessoas, em que elas vão deixar de valorizar esse tipo de coisas, a meu ver, secundárias. Importo-me, sim, com o que dizem da minha música.

PP – “Beatsound Loverboy” é um registo auto-biográfico, intemporal e versátil, que, através do electro rock, aborda, essencialmente, as temáticas amor e sexo. Que características do primeiro álbum se mantêm em “Be Someone Else”?

S – A mistura entre o rock e a música electrónica mantém-se, embora este segundo disco tenha privilegiado, mais do que o primeiro, a banda. A sua produção não foi um processo tão individual como a do primeiro, onde trabalhei completamente sozinho, sem banda, sem ninguém, além dos produtores, a quem pedir opinião. Neste álbum, que veio, de certa forma, firmar-me como músico profissional, senti, também, mais responsabilidade, não na escolha dos temas a abordar, mas na forma como os abordar. Continuo a ser romântico, a ser sexual (embora ache que o acto sexual não está tanto nas letras das minhas músicas, mas sim na forma como encaro o palco), mas abordo os temas de forma mais adulta, mais madura, mais profissional. “Be Someone Else” tem, também, mais alertas. O próprio título do álbum é um alerta.

PP – Em que sentido?

S – Numa primeira estância, quando escrevi a letra da música que dá nome ao álbum, pretendia alertar aqueles que pouco trabalham, esperando, mesmo assim, resultados. Se queres ser alguém, tens que dar muito de ti próprio, não basta dar apenas um bocadinho e esperar que chegue. Entretanto, com o passar dos anos, apercebi-me que a música servia, igualmente, às pessoas que nos vão tentando deitar abaixo ao longo deste caminho. A vida não é uma corrida. Temos que ser nós próprios, abrir os olhos e olhar sempre para a frente.

PP – O Slimmy e o Paulo Fernandes são uma, e uma só, pessoa? É um a continuação do outro? Ou é o Slimmy uma personagem, que nada tem a ver com o Paulo?

S – O Slimmy acaba por ser, simultaneamente, uma personagem e a continuação do Paulo. Continuação, na medida em que, como já referi, o Paulo já era irreverente, arrojado, espontâneo. Personagem a partir do momento em que o Slimmy aparece como animal de palco, a partir do momento em que está sujeito à opinião das pessoas.

PP – Quais são os planos de divulgação deste novo álbum? “Be Someone Else” foi, à semelhança de “Beatsound Loverboy”, pensado tendo em vista a sua internacionalização?

S – Sinceramente, ainda estou um pouco alheio ao que se vai passar nos próximos meses. Posso assegurar, no entanto, que já há contactos feitos lá fora, principalmente na Alemanha e em França. Mas, neste momento, é minha intenção percorrer novamente o país de forma intensiva. Trata-se de tentar chegar a um maior número de pessoas possível. Ainda há muitas pessoas que não me conhecem.

PP – A internacionalização não é, então, para já, uma prioridade…

S – As portas estão abertas, mas, a acontecer alguma coisa lá fora, tem que ser sustentada. Mas vamos continuar com uma perna lá fora, definitivamente. Aliás, a internacionalização é uma ambição minha desde o início. Tenho casa em Berlim, tenho casa em Londres, quando me apetecer ir, vou. Mas não se pense que sobrevalorizo um mercado face ao outro, até porque, actualmente, é o que faço em Portugal que me permite viver. É um valor seguro: os portugueses gostam de mim cada vez mais.

PP – Actualmente, são cinco as pessoas que dão corpo ao projecto que protagonizas. Não sentes falta, por vezes, dos tempos de One Man Show?

S – Independentemente do tamanho da banda que me acompanha, acho que vou ser sempre só um. Por exemplo, neste novo disco, fui eu, sozinho, que estive tardes e noites intermináveis com os produtores. Fui eu, sozinho, que fui para Inglaterra terminá-lo: gravava baixo de manhã, guitarra de tarde. Vou ser sempre eu a ter a última palavra. O processo de criação vai rodar sempre à minha volta. Nesses termos, sinto-me, ainda, um One Man Show, e ainda bem.

PP – Talvez seja esse um dos segredos do sucesso do projecto…

S – Sem dúvida, é este, provavelmente, o grande segredo do Slimmy. Convém haver sempre alguém que tenha as ideias mais definidas, mais concretas. Se fôssemos cinco a criar música, seria uma confusão, demoraria muito mais tempo, e, provavelmente, a música não seria tão interessante como é. Fico feliz que confiem em mim, nos meus gostos, nas minhas influências, e na minha capacidade de tornar uma música apetecível.

PP – Quais são, hoje em dia, as tuas referências musicais, nacionais e internacionais?

S – Continuo a gostar de muita coisa. As minhas influências são mesmo muito ecléticas. Continuo a adorar Guns n’ Roses. Prodigy, também gosto bastante. Chemical Brothers. A nível nacional, são várias as bandas que aprecio, mas, mais do que as bandas, tenho figuras que me influenciam, como o Zé Pedro ou o Rui Reininho. Não quero com isto dizer que, neste momento, seja o maior fã dos Xutos ou dos GNR, mas são eles os meus heróis de infância. Continuo a gostar deles, mas já não me surpreendem. De resto, gosto da maneira como algumas bandas fazem música em Portugal, entre as quais os X-Wife, os Chemical Wire ou os The Eleanors. Fazem música com potencial.

PP – O teu myspace, que fazias questão de actualizar quase que diariamente aquando do lançamento de “Beatsound Loverboy”, está, agora, desactualizado, esquecido. Decresceu, para ti, a importância das redes sociais?

S –O Myspace está quase morto. Tenho usado o facebook, que me permite ser mais «terra a terra» com os meus fãs, que me permite ser eu próprio e não o artista que se esconde por detrás de uma página do myspace. As redes sociais são bastante importantes, claro, passam a tua mensagem a muita gente, mas têm que ser exploradas da melhor forma.

Sara Novais

Fotografia: Tiago Ribeiro